Fábrica em Cristalina espera energia há mais de 1 ano para começar a operar


Quem sai da cidade de Cristalina (GO), no sentido de Brasília, avista o primeiro galpão industrial da BR-050 após cerca de 10 quilômetros. É uma construção de 2.000 metros quadrados, que abriga uma das mais modernas linhas de produção de ração para cães e gatos do Brasil. A instalação é a primeira filial da Nutridani, empresa com sede em Cambira, na região de Apucarana, norte do Paraná.

A primeira das três linhas de produção planejadas está pronta e deveria estar funcionando há mais de um ano, desde o final de 2015, mas não há energia para pô-la em funcionamento. Por causa disso, o projeto --que inclui ainda a construção de mais dois galpões para armazenagem-- está parado.

Não há nenhuma movimentação de funcionários nem de caminhões, que deveriam abastecê-la com grãos de milho e soja produzidos na região.

350 empregos

A Prefeitura de Cristalina estima que a operação geraria 350 empregos, 300 deles fora da Nutridani. "Só na área industrial, nós criaríamos 40 empregos diretos, considerando um turno de trabalho e apenas a primeira linha das três planejadas", diz o gerente-geral da Nutridani, Mério Gallo.

A Nutridani não divulga o valor do investimento nem a expectativa de faturamento. Na época em que a obra foi anunciada, a Prefeitura de Cristalina divulgou que o investimento na primeira fase da obra seria de R$ 12 milhões. Segundo Gallo, cada linha teria capacidade para produzir 10 toneladas de ração por hora ou até 3.000 toneladas por mês, em dois turnos, a um valor de varejo superior a R$ 15 milhões.

Região rica, perto de Brasília

A fábrica não fica em uma região carente, isolada, nem de difícil acesso. Ao contrário. Cristalina está a 130 quilômetros da capital federal, tem um dos dez maiores PIBs agrícolas do país e é cortada por duas estradas federais parcialmente duplicadas. A própria fábrica da Nutridani foi construída na rodovia que liga a cidade à capital do país, em um trecho já duplicado.

E energia também não falta. "Hoje, com a queda do consumo por conta da recessão e com o preço nas alturas, há uma folga na oferta de energia no país", diz o professor Amaro Pereira, da Coope, que coordena as pós-graduações em engenharia na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O problema, aqui, é de distribuição da energia, responsabilidade da Celg Distribuição. A empresa pertencia ao governo de Goiás, não foi privatizada nos anos 1990, acabou sendo absorvida pela Eletrobras, em 2015, e, no final de 2016, foi arrematada pelo grupo italiano Enel Brasil, por R$ 2,2 bilhões, no primeiro processo de privatização do governo Michel Temer.

Vacas leiteiras passando calor

A falta de energia na região de Cristalina não afeta apenas a Nutridani. Ela prejudica também o agronegócio, esteio da economia local. "Nós recebemos 50 MW e, se recebêssemos mais 50 MW hoje, não haveria sobra. Iria tudo para projetos já instalados ou que estão à espera apenas da energia", diz o secretário de desenvolvimento econômico do município, Carlos Sponchiado.

A falta de energia em Cristalina teve consequências para 700 vacas leiteiras da raça holandesa da fazenda Figueiredo, que estão entre as mais produtivas do país, com média de mais de 30 litros de leite por dia por cabeça. Para atingir esse volume, as vacas não podem passar calor.

O "conforto térmico" dos animais é proporcionado por um sistema composto de chuveiros automáticos, como os de equipamentos anti-incêndio, e enormes ventiladores. Primeiro, os chuveiros molham as vacas, depois, os ventiladores entram em funcionamento para ajudar a evaporar a água do couro dos animais, reduzindo, assim, a temperatura do corpo deles.

Mas o processo todo consome energia. Sem energia suficiente para todo o rebanho de cerca de 2.000 animais, 700 deles foram descartados, ou seja, vendidos para abate em frigoríficos. "Sem o conforto térmico, o animal começa a sofrer, e a produtividade também cai", diz Luiz Carlos Figueiredo, que usa geradores a diesel para os momentos em que a energia, que já é insuficiente, cai.

Atraso de pelo menos três anos

O diretor técnico da Celg Distribuição, Humberto Eustáquio, admite o atraso, de pelo menos três anos, nas obras para levar mais energia a Cristalina. De acordo com ele, a demora foi provocada por problemas nas quatro primeiras licitações para contratar a obra de ampliação da rede. "No final de 2015, relicitamos e finalmente conseguimos contratar."

Segundo ele, as obras na linha de transmissão de 52 quilômetros que levará a energia da subestação de Rio Vermelho, em Luziânia, a Cristalina deve ser entregue no meio do ano e está orçada em cerca de R$ 30 milhões.

Asdrúbal Figueiró - UOL

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